Entrevista realizada pela revista Guia do estudante
A ENGENHARIA DO SÉCULO XXI Uma das mentes mais privilegiadas da engenharia dá conselhos aos jovens que pretendem ingressar nessa carreira
Vahan Agopyan nasceu em Istambul, na Turquia, e mudou-se para o Brasil ainda menino. Formado em engenharia civil em 1974, pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (da qual foi diretor entre 2002 e 2005), concluiu o doutorado em Londres, em 1982, mas regressou ao país para assumir compromissos com a vida acadêmica. Pesquisador de carteirinha, ele tem dezenas de artigos publicados nos mais respeitados anais de congressos e nas mais importantes revistas de engenharia do mundo.
Nesta entrevista para o Guia do Estudante, Agopyan ressalta, entre outros assuntos, qual a formação ideal para o engenheiro do futuro.
GE: Qual é o perfil de um bom engenheiro?
Vahan Agopyan: O mercado de trabalho está com as portas abertas para o engenheiro que se preocupe com os problemas sociais e ambientais do país, que tenha formação abrangente em ciências básicas da engenharia e que seja competente no relacionamento humano.
GE: O senhor pode dar alguns exemplos do papel do engenheiro nos dias de hoje?
Agopyan: Quando um engenheiro se senta à frente de um computador para idealizar um simples utensílio doméstico, deve ter em mente que os materiais que ele está pensando em projetar irão interferir na sociedade e no meio ambiente. Isso é fato. Sem falar que um trecho aparentemente insignificante de uma estrada pode acabar com uma área ambientalmente preservada. O engenheiro precisa ter sensibilidade e responsabilidade social para dimensionar essas questões.
GE: Qual a maior deficiência no jovem que conclui o ensino médio e ingressa na faculdade de engenharia?
Agopyan: O ensino médio no Brasil é pasteurizado para que o aluno seja um receptor de informações. O maior choque desse jovem ao ingressar na faculdade de engenharia é que ele deixa de receber a informação passivamente e é obrigado a buscar o entendimento das questões e apresentar soluções também. O professor estará ali apenas para orientá-lo.
GE: E como é a metodologia de ensino que o aluno deve assimilar?
Agopyan: Nas aulas de introdução à engenharia, por exemplo, que são fundamentais para a formação de um bom profissional, o aluno será preparado para trabalhar em grupo. Diferentemente do que muitos candidatos imaginam, o engenheiro só consegue trazer boas soluções e superar resultados se atuar em equipe.
GE: O que o jovem deve esperar de um curso de engenharia para que sua escolha não seja frustrada?
Agopyan: Deve primar pela formação em vez de esperar pela avalanche de informações. E não estou falando de algo simplista como aprender a executar uma obra. Formação é ciência básica, que se consegue por meio de muita pesquisa. É comum vermos alunos do quarto ano de engenharia queixando-se de que estão na reta final do curso e não sabem assentar um tijolo. Eu, então, aconselho-os a trocar de escola, pois o engenheiro não precisa dominar essa tarefa. Sua formação deve ser dirigida para a pesquisa de métodos ou de recursos em benefício do ser humano.
GE: Há dados sobre a porcentagem de alunos que entram na faculdade de engenharia e não finalizam o curso?
Agopyan: Aproximadamente 15% dos alunos desistem do curso. E o ponto principal da desistência não é o fato de ter de estudar muito. O abandono ocorre por falta de vocação. O candidato infelizmente imagina que a engenharia é uma ciência exata, mas quando entra para a universidade percebe que ela envolve riscos e ele será cobrado a tomar decisões justamente em cima desses riscos.
GE: Há uma minoria de engenheiras no Brasil. Os homens são mais bem-sucedidos na profissão?
Agopyan: Isso é um paradigma, pois em 30 anos de profissão eu nunca vi algo dentro de qualquer uma das engenharias que uma mulher não possa executar tão bem quanto um homem. Puro preconceito reforçado pela sociedade.
GE: O engenheiro é um profissional bem-remunerado?
Agopyan: Há uma reclamação de que as remunerações dos engenheiros são baixas, de que no passado eram melhores. Mas o fato é que o salário médio do brasileiro despencou.
GE: A profissão está saturada ou o mercado absorve bem os recém-formados?
Agopyan: Um engenheiro eclético com boa formação sempre terá trabalho, pois as empresas valorizam duas qualidades fundamentais nesses profissionais: saber tomar decisões que envolvem riscos e ter conhecimento fantástico em matemática e lógica. E isso é ouro na área financeira e comercial. Tanto que hoje encontramos muitos engenheiros no comando de empresas multinacionais.